Monday, January 08, 2007

ACERCA DO DIRECTOR-GERAL DOS IMPOSTOS

Julgo que não tenho dívidas ao fisco. Digo julgo pois já me aconteceu no passado julgar o mesmo e uns meses ou anos depois surgir o postal que anuncia a inevitável visita à repartição de finanças. Nunca fiando …

Muito tempo atrás fiz a minha única “reclamação graciosa”. Esta é uma designação convenhamos muito interessante que deve querer dizer que o contribuinte para reclamar o que lhe pertence e que o fisco tomou como seu não tem que pagar nada.

Esse meu caso da “graciosa” é antigo e, no fundo, resumiu-se a pagar primeiro um montante de imposto que já se sabia não ser devido por mim ao fisco para através da tal reclamação o reaver mais tarde sem juros. Muito depois! Anos depois! Uma espécie de empréstimo forçado e a prazo ao Estado

Certamente esta notícia acerca das “graciosas” está inserida na campanha pela recondução do actual director geral dos impostos * e pretende demonstrar a sua alta capacidade para gerir o fisco. Aproveito para declarar a minha total oposição à recondução nas actuais condições do sobredito director geral cujo não conheço nem pretendo hostilizar.

Em primeiro lugar deve existir uma lei que preside à fixação das remunerações dos dirigentes da administração pública **. A lei, por princípio, é igual para todos. E não deve haver função mais no cerne do que se designa por ap do que a de dgi. Ninguém imagina, por enquanto, a privatização do fisco.

Caso o governo esteja na disposição de fazer uma revolução no sistema das carreiras e remunerações na ap então estou de acordo em rever a minha posição acerca do estatuto remuneratório do actual dgi. Seria necessário criar um sistema de indexação das remunerações dos dirigentes e funcionários à produtividade dos serviços públicos.

Pois se no passado foram sendo criados entes públicos da mais diversa natureza para ultrapassar a rigidez da administração pública tradicional permitindo pagar remunerações diferenciadas e nalguns casos principescas aos seus dirigentes porque razão não prosseguir no mesmo caminho? O actual PR tem uma larga experiência nessa matéria.

Mas nesse caso teria o governo que reduzir drasticamente a dimensão da ap, muito além do que está previsto no PRACE, circunscrevendo as funções do estado aos mínimos que as teorias liberais identificam com pouco mais do que as funções de soberania e de regulação ou seja avançar a fundo no caminho do desmantelamento do chamado estado social. Não me parece que seja essa a linha política do governo nem sequer que a sociedade pudesse suportar as consequências da conflituosidade que tal solução acarretaria.

Seria fastidioso enumerar as direcções gerais e organismos congéneres que pela sua natureza e influência directa e indirecta em delicados assuntos de estado ou em decisões que envolvem negócios milionários deveriam ter à sua frente directores remunerados ao mesmo nível do actual dgi.

Enumero à mão levantada os dirigentes dos serviços secretos, os titulares dos tribunais superiores, os altos comandos das forças armadas, os embaixadores, os militares em teatros de operações, os dirigentes da protecção civil, os juízes, os magistrados, os directores ligados ao ambiente e ao planeamento do território, os presidentes de câmara e vereadores do urbanismo, os directores gerais ou presidentes de organismos vocacionados para o controle da despesa pública …o primeiro ministro e o presidente da república!!!

A conversa parece um pouco ridícula mas é mesmo ao que leva a discussão que está lançada em volta da manutenção de um director geral que ganha mais do que o mais alto magistrado da nação. Eu sei que há outros dirigentes de organizações públicas – não directores gerais – nas mesmas condições alguns deles a caminho da Índia mas isso não muda nada ao essencial da questão.

É que o grande problema das nossas contas públicas não está do lado da receita – amamentada a impostos – mas do lado da despesa – no qual ironicamente se coloca o problema da altíssima remuneração do actual dgi. Já agora para aqueles mais distraídos destas coisas das remunerações na ap lembro que a remuneração mensal bruta do actual dgi é muito semelhante à remuneração anual bruta de um assessor técnico próximo do topo da carreira da ap ou seja qualquer coisa como 27.500 euros, sem levar em conta as alcavalas que acrescem à remuneração daquele tal como automóvel com motorista, etc. etc. … as quais nem sequer questiono.

E quem nos garante que a produtividade de um assessor técnico em determinadas áreas da administração pública não seja igual ou superior à do actual dgi? Quem garante que muitos técnicos da ap através da sua acção honesta e competente não contribuem directamente para que o estado arrecade benefícios materiais – financeiros e outros – e imateriais superiores aos que dizem ter ajudado a arrecadar em impostos o actual dgi?

Seria necessário conhecer a natureza das decisões de cada um e a influência das mesmas em matérias de relevante interesse público … Mas uma coisa é certa: há poucos a ganhar muito e muitos a ganhar pouco. Dos poucos que muito ganham nem todos serão competentes; dos muitos que pouco ganham nem todos serão incompetentes. Que lhes parece?

É para o equilíbrio desta balança que qualquer reforma da ap tem que contribuir. Mas sempre haverá limites para as remunerações de cada um dos dirigentes da ap e nesses limites nunca caberá no Portugal contemporâneo a remuneração do actual dgi. Ou muda a remuneração ou muda o titular do cargo. Qualquer engenharia remuneratória para tornear o essencial da questão deixará ao governo um pesado encargo político para o futuro.

Arriscando uma conclusão: se o actual Director Geral dos Impostos, Paulo Macedo, for renomeado, nas actuais condições remuneratórias, vence a lógica do privilégio à arrecadação de receitas no ataque ao deficit público; se for afastado ou, renomeado com uma remuneração compatível com o estatuto de director geral, vence a lógica do privilégio à contracção da despesa em coerência com a reforma da ap.

Estou pela minha parte disponível para indicar ao governo uma meia dúzia de nomes de dirigentes da ap nos quais não me incluo capazes de assumir a função com competência e galhardia. Não sei é se os sindicatos e os banqueiros gostarão deles!

* dgi – Director-Geral dos Impostos
** ap – Administração Pública
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