Sunday, November 14, 2004

Imigração - "O problema social mais grave da Europa"


Estatística


Quando eu nasci havia em Portugal
(em Portugal continental
e nas ridentes,
verdes e calmas
ilhas adjacentes)
uns seis milhões e umas tantas mil almas.
Assim se lia
no meu livrinho de Corografia
de António Eusébio e Morais Soajos.
Hoje, graças aos progressos da Higiene e da Pedagogia
já somos quase dez milhões de gajos

António Gedeão

Nos próximos decénios não será mais possível escrever um poema como o que serve de epígrafe a este artigo.

Não é, pois, possível levar a sério qualquer programa político que omita os problemas da demografia e da imigração quando todas as sociedades ocidentais estão confrontadas com as questões do envelhecimento demográfico e da chegada, em massa, aos seus territórios, de estrangeiros em busca e trabalho.

São estas questões que, paradoxalmente, não merecem ser abordados, com autonomia e de forma estruturada, nos programas políticos dos candidatos à liderança do PS.

Estes não são fenómenos conjunturais e passageiros. O envelhecimento demográfico e a imigração, sendo duas faces da mesma moeda, “vieram para ficar”, constituindo-se como problemas de cuja resolução depende, em boa medida, a própria sobrevivência do nosso modelo de sociedade.

Como resultado da queda da natalidade e do aumento da esperança de vida os mais “velhos” serão, muito em breve, em número superior aos jovens e todas as projecções confirmam que os descontos dos activos serão, a médio prazo, insuficientes para pagar aos pensionistas.

O estudo recente “Contributos dos imigrantes na demografia portuguesa”, de Maria João Valente Rosa, aponta para a necessidade de Portugal “importar” 188.000 imigrantes por ano, durante 20 anos, para que em 2021 não se tenha degradado a relação estatística entre pessoas activas e pessoas idosas que o país detinha em 2001.

Em Portugal, por outro lado, o número de beneficiários das pensões de invalidez, velhice, sobrevivência e de rendimentos provenientes do fundo de desemprego e do rendimento mínimo garantido, em 2003, elevava-se a 3,5 milhões, representando 64% da população activa. («Retracto Territorial de Portugal», divulgado pelo INE).

Estes dados, só por si, ilustram a dimensão do desafio político, económico e social que a demografia e a imigração comportam para o futuro de Portugal.

Convenhamos que é assustador que os programas políticos dos partidos com aspirações ao governo, como é o caso do PS, omitam ou desvalorizem, em particular, o problema da imigração. Por isso apoiei, colaborando na redacção da moção de política global “Uma Esquerda com Raízes e com Futuro”, no âmbito do Congresso do PS, que chama esse tema ao debate.

Ralf Dahrendorf num artigo recente, publicado no “Público”, assinala a importância do problema da imigração afirmando que “actualmente, na Europa, este talvez seja o problema social mais grave, porque ninguém tem uma ideia clara sobre a forma de resolver o choque de culturas que daí resulta.”

A imigração é uma daquelas questões que, no ocidente, torna cada vez mais pertinente a pergunta: afinal para que servem os partidos e os governos, senão para enfrentar e resolver os problemas mais graves e difíceis com que se deparam as nossas sociedades?



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