Na passada semana, a Comissão Europeia publicou um documento1 que celebra da melhor maneira o décimo aniversário do lançamento da fase decisiva da introdução do euro, ocorrido em Maio de 1998. Este é o que pode chamar-se um documento de entrada na maioridade, que não se fica pelos sound bites, mas analisa os resultados até agora obtidos, identifica os problemas actuais e os desafios futuros e – o que é mais importante – apresenta propostas de políticas capazes de começar a responder-lhes.
Entre os êxitos alcançados destaca-se o controlo da inflação e a criação de emprego. Para o conjunto da Zona Euro, a inflação rondou, em média, os 2% na década da sua vigência e, desde a introdução efectiva da moeda única, em 1999, até 2007, foram criados quase 16 milhões de postos de trabalho. Em Portugal, a inflação média, de acordo com o IPC, atingiu os 2,9%, um resultado que compara com uma média de 7,6% desde a integração na UE até 1998. Igualmente importante é o facto de a inflação máxima registada a partir daí não ter ultrapassado os 4,3% (em 2001), quando na década de 80 tinha chegado quase aos 30% e, mesmo após a adesão, tinha atingido os 13,2% em 1990. Uma consequência directa desta evolução foi a redução das taxas de juro e o acesso aos mercados monetários e financeiros internacionais, em condições idênticas às usufruídas por países desenvolvidos com uma história comprovada de estabilidade monetária.
Também em matéria de criação de emprego, a década posterior à introdução do euro foi mais favorável em Portugal do que o período que decorrera desde a adesão à UE, não obstante o forte crescimento económico então registado. De facto, entre 1998 e 2007 criou-se em Portugal 453 mil postos de trabalho, contra 386 mil entre 1986 e 1998. A explicar este resultado, aparentemente contraditório com a evolução do desemprego, está o facto de, na última década, o acréscimo da população activa ter sido de 578 mil indivíduos contra apenas 225 mil no período anterior. Com efeito, o resultado nesses anos é explicado pela conjugação da entrada mais tardia na vida activa por parte dos jovens e da antecipação da idade da reforma, duas evoluções de carácter necessariamente transitório, que reduziram significativamente o crescimento da população activa ao longo do período.
A evolução do emprego – e a da população activa, que lhe está subjacente – é uma questão retomada no relatório da Comissão Europeia a propósito das diferentes evoluções entre Portugal e a Espanha em matéria de convergência real. Ela constitui, de facto, um dos principais factores que explicam os diferentes desempenhos dos dois países, a par com a taxa de conversão à entrada para o euro, com o diferente comportamento em matéria de finanças públicas e com o atraso registado em Portugal no ajustamento de sectores-chave da economia (em particular as indústrias tradicionais intensivas em mão-de-obra).
A perspectiva do documento é sobretudo a de avaliar os desafios futuros, o que não deixa de exigir que se analise criticamente o passado. No caso da economia portuguesa, as questões que se mantêm relevantes para o futuro referem-se, em primeiro lugar, à necessidade de encarar, séria e estavelmente, o compromisso de equilíbrio das finanças públicas e de adaptar, onde necessário, os preceitos institucionais que as regem. As enormes diferenças registadas nesta matéria entre Portugal e Espanha não deixam dúvidas quanto ao facto de ela constituir uma condição necessária da desejada convergência real da economia, um conceito que obviamente só faz sentido no médio/longo prazo.
A segunda questão-chave diz respeito ao emprego e às condições para o seu crescimento estável. A análise quantificada da evolução das duas economias ibéricas identifica o comportamento do emprego como o factor com a maior contribuição para os diferentes desempenhos em termos de crescimento económico, face a evoluções semelhantes em matéria de produtividade. Esta será inquestionavelmente uma variável fundamental na evolução futura, mas Portugal tem de adaptar as instituições do mercado do trabalho, não só com vista a garantir o maior crescimento, mas também condições de equidade e de estímulo à formação e ao ajustamento ao novo enquadramento internacional.
Os aspectos mais relevantes do documento agora publicado pela Comissão Europeia são os que respeitam à forma como a Zona Euro deve preparar-se para vencer os desafios que defronta.
Estes resultam, por um lado, do fraco crescimento do produto potencial e das incertezas que daí decorrem para a manutenção do bem-estar dos cidadãos e, por outro, da necessidade de proteger eficazmente os interesses da Zona Euro no contexto da economia global.
Dois conjuntos de recomendações são especialmente importantes nestas áreas: (i) as que se referem à necessidade de coordenação das reformas estruturais, no seio da própria Zona Euro; e (ii) as que respeitam à consolidação da representação da Zona nos fora internacionais relevantes. Resta esperar que as propostas agora avançadas tenham a sequência apropriada.
1* EMU@10 – successes and challenges after ten years of Economic and Monetary Union, disponível “online”.
Teodora Cardoso, in Jornal de Negócios
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